quarta-feira, 27 de setembro de 2017

As lições ambientais que o Brasil não aprendeu põem em risco a vida dos brasileiros

Não acredito que o Brasil, ou melhor dizendo, o governo brasileiro tenha aprendido as lições sobre preservação ambiental nas últimas décadas. A triste realidade que estamos vivendo, com a destruição dos biomas brasileiros, desrespeito aos povos tradicionais, desmanche das leis ambientais, enfraquecimento do Ibama e o aumento das emissões de gases de efeito estufa confirmam a má vontade dos governos anteriores, e deste atual, de cumprir compromissos assumidos desde os anos 1970. 

Os últimos presidentes da República continuam defendendo interesses imediatistas, desde Estocolmo, em 1972. Suas escolhas são equivocadas, depois de terem assumido compromissos na Rio 92 e na Rio + 20. Apesar de aceitarem acordos, deixaram de fazer um controle eficaz da poluição e do desmatamento, alegando que isso poderia reduzir o crescimento. Com os problemas que cercam o poder, o tão cantado crescimento de 5% ao ano desceu a ladeira. Prova que deixar a questão ambiental no fim da fila não ajudou a recuperar a economia. 

As lições ambientais que o Brasil não aprendeu põem em risco a vida dos brasileiros

Telma Monteiro, para o Correio da Cidadania

Não acredito que o Brasil, ou melhor dizendo, o governo brasileiro tenha aprendido as lições sobre preservação ambiental nas últimas décadas. A triste realidade que estamos vivendo, com a destruição dos biomas brasileiros, desrespeito aos povos tradicionais, desmanche das leis ambientais, enfraquecimento do Ibama e o aumento das emissões de gases de efeito estufa confirmam a má vontade dos governos anteriores, e deste atual, de cumprir compromissos assumidos desde os anos 1970.

Os últimos presidentes da República continuam defendendo interesses imediatistas, desde Estocolmo, em 1972. Suas escolhas são equivocadas, depois de terem assumido compromissos na Rio 92 e na Rio + 20. Apesar de aceitarem acordos, deixaram de fazer um controle eficaz da poluição e do desmatamento, alegando que isso poderia reduzir o crescimento. Com os problemas que cercam o poder, o tão cantado crescimento de 5% ao ano desceu a ladeira. Prova que deixar a questão ambiental no fim da fila não ajudou a recuperar a economia.

Exemplos não nos faltam. Quanto estão custando as catástrofes ambientais aos governos do mundo inteiro? Europa, EUA, por exemplo, estão sofrendo com eventos extremos e o mais evidente, o Caribe, avança numa situação de calamidade que produzirá refugiados ambientais. E o Brasil vai pelo mesmo caminho. É certo que não temos furacões, tufões ou tornados, ou tempestades atípicas e secas que devastam a Europa nos dois últimos meses. As queimadas incendeiam florestas que deveriam servir para equilibrar o clima e, aqui no Brasil, os biomas ardem com a seca excessiva. Não há dúvidas que o capital agropecuário já começa a sentir os reflexos da sua própria incúria.

As populações sofrem com os eventos climáticos e seus prejuízos jamais são recuperados ou indenizados. O agronegócio também sofre, com a diferença que ele tem atrás de si todo o aparato do custeio por parte dos bancos públicos com juros subsidiados. Para recuperar a lavoura perdida não falta dinheiro. Para proteger as florestas falta tudo, desde infraestrutura de combate aos incêndios à fiscalização contra ocupação, grilagem e desmatamento. Estamos vivendo o desmanche de anos de tentativas de incutir na sociedade o respeito à Natureza.

Reservatórios de hidrelétricas estão abaixo de sua capacidade de armazenamento e a sociedade prestes a sofrer um colapso na geração de energia elétrica. Risco que corremos por não termos, em tempo, planejado nossas estratégias de mudança da matriz energética. Não seguimos, a exemplo de outros países, mudar o futuro e preferimos depender de uma fonte que sofre muito com as mudanças climáticas: a energia hidrelétrica.

Uma tentativa de retomada da economia brasileira está como sempre desconectada da questão ambiental. Tenho a impressão que sempre esteve. É verdade que a recuperação econômica e política, por si só, não podem, por decreto, serem sinônimos de redução da miséria. As políticas públicas estão absolutamente defasadas em relação à preocupação com a economia limitada à bolsa de valores e a capitais de oportunidade que vão e vêm.

Bancos se dão muito bem nesse caldo de cultura financeiro, grandes empresas que dependem de investimentos com dinheiro público, também, e um leque de companhias de investimentos mobiliários buscam a estabilidade do dinheiro e não a produção de riquezas para empregar brasileiros.

Com relação ao meio ambiente, a proposta brasileira para redução da emissão de gases de efeito estufa, por exemplo, nunca foi verdadeiramente ambiciosa. Evidência, essa, explícita nas décadas de ignorância da responsabilidade que nos cabe no aumento do aquecimento global.

As “pitonisas” da economia do governo federal se obstinam em adivinhar se as metas econômicas serão ou não atingidas, neste ou naquele momento. Enquanto isso, o erro estratégico de não enfrentar a raiz dos problemas impede o mais primário estágio de desenvolvimento com distribuição equânime de riquezas, promovendo fragilidade e insustentabilidade social e ambiental. 

Enquanto o Brasil perseguir a tal meta de destaque no mundo global, em detrimento das mudanças climáticas, do uso sustentável das riquezas naturais e do equilíbrio político, o protagonismo na América Latina não virá. E não sei ao certo para que serviria. Não dá mais para tentar uma arrancada de credibilidade, como tenta fazer Temer, protocolarmente, na ONU, tendo perdido a noção da importância da preservação da Amazônia, ou do Pantanal, ou do Cerrado.

Se o Brasil não cumpre minimamente sua agenda interna de sustentabilidade seria simplesmente irônico que cumprisse seus compromissos internacionais de redução das emissões e proteção dos seus biomas.

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Exemplos não nos faltam. Quanto estão custando as catástrofes ambientais aos governos do mundo inteiro? Europa, EUA, por exemplo, estão sofrendo com eventos extremos e o mais evidente, o Caribe, avança numa situação de calamidade que produzirá refugiados ambientais. E o Brasil vai pelo mesmo caminho. É certo que não temos furacões, tufões ou tornados, ou tempestades atípicas e secas que devastam a Europa nos dois últimos meses. As queimadas incendeiam florestas que deveriam servir para equilibrar o clima e, aqui no Brasil, os biomas ardem com a seca excessiva. Não há dúvidas que o capital agropecuário já começa a sentir os reflexos da sua própria incúria. 

As populações sofrem com os eventos climáticos e seus prejuízos jamais são recuperados ou indenizados. O agronegócio também sofre, com a diferença que ele tem atrás de si todo o aparato do custeio por parte dos bancos públicos com juros subsidiados. Para recuperar a lavoura perdida não falta dinheiro. Para proteger as florestas falta tudo, desde infraestrutura de combate aos incêndios à fiscalização contra ocupação, grilagem e desmatamento. Estamos vivendo o desmanche de anos de tentativas de incutir na sociedade o respeito à Natureza. 

Reservatórios de hidrelétricas estão abaixo de sua capacidade de armazenamento e a sociedade prestes a sofrer um colapso na geração de energia elétrica. Risco que corremos por não termos, em tempo, planejado nossas estratégias de mudança da matriz energética. Não seguimos, a exemplo de outros países, mudar o futuro e preferimos depender de uma fonte que sofre muito com as mudanças climáticas: a energia hidrelétrica. 

Uma tentativa de retomada da economia brasileira está como sempre desconectada da questão ambiental. Tenho a impressão que sempre esteve. É verdade que a recuperação econômica e política, por si só, não podem, por decreto, serem sinônimos de redução da miséria. As políticas públicas estão absolutamente defasadas em relação à preocupação com a economia limitada à bolsa de valores e a capitais de oportunidade que vão e vêm. 

Bancos se dão muito bem nesse caldo de cultura financeiro, grandes empresas que dependem de investimentos com dinheiro público, também, e um leque de companhias de investimentos mobiliários buscam a estabilidade do dinheiro e não a produção de riquezas para empregar brasileiros.

Com relação ao meio ambiente, a proposta brasileira para redução da emissão de gases de efeito estufa, por exemplo, nunca foi verdadeiramente ambiciosa. Evidência, essa, explícita nas décadas de ignorância da responsabilidade que nos cabe no aumento do aquecimento global. 

As “pitonisas” da economia do governo federal se obstinam em adivinhar se as metas econômicas serão ou não atingidas, neste ou naquele momento. Enquanto isso, o erro estratégico de não enfrentar a raiz dos problemas impede o mais primário estágio de desenvolvimento com distribuição equânime de riquezas, promovendo fragilidade e insustentabilidade social e ambiental.  

Enquanto o Brasil perseguir a tal meta de destaque no mundo global, em detrimento das mudanças climáticas, do uso sustentável das riquezas naturais e do equilíbrio político, o protagonismo na América Latina não virá. E não sei ao certo para que serviria. Não dá mais para tentar uma arrancada de credibilidade, como tenta fazer Temer, protocolarmente, na ONU, tendo perdido a noção da importância da preservação da Amazônia, ou do Pantanal, ou do Cerrado.

Se o Brasil não cumpre minimamente sua agenda interna de sustentabilidade seria simplesmente irônico que cumprisse seus compromissos internacionais de redução das emissões e proteção dos seus biomas.

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terça-feira, 19 de setembro de 2017

Para quem Temer quer dar a Amazônia?


As mineradoras fingem que respeitam a legislação ambiental e o Ministério do Meio Ambiente, Ibama, Secretarias Estaduais e Municipais de Meio Ambiente fingem que fiscalizam.
Telma Monteiro

Li que a Renca deveria ser anulada para que a indústria mineradora e “redentora” pudesse se soltar e transformar a riqueza da Amazônia em riqueza do povo brasileiro. Onde, no Brasil, alguma mineradora, alguma vez, transformou a exploração em algo que não fosse degradação e desastre? E, lógico, em enormes lucros para si própria.

Quando foi criada, a Renca deveria preservar a região para a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), hoje apenas Vale. Na época a companhia estava sob a presidência de Eliezer Batista ( que para quem não sabe é pai de Ike Batista) conhecedor dos mapas das minas de toda Amazônia. Liberar a Renca, como quer o governo Temer, será perpetuar a apropriação dos recursos naturais, na forma de commodities minerais, sem agregar valor, para exportar para a China, por exemplo.

O potencial da Renca é rico em ouro, ferro, manganês e tântalo, por enquanto. É o que foi dito pelo ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho, ao presidente Temer. Segundo o geólogo Antônio Feijão, ex-diretor do Departamento Nacional de Produção Mineral (DNPM) no Amapá, pode-se multiplicar muitas vezes a quantidade de ouro de Serra Pelada. Só com essa afirmação pode-se imaginar o que acontecerá com a região se a Renca for desbloqueada.

Como costuma acontecer, vão enxotar indígenas, degradar rios e marcar a floresta com ferro e fogo. A grande parte dos processos minerários, anteriores a 1984, “preservada”, foi objeto de apropriação do próprio Estado para uso do próprio Estado, em parceria com empresas e interesses impublicáveis.
Na esteira da mineração vem todo o resto. Vem a ocupação, a grilagem, o agronegócio predatório, as queimadas, a contaminação dos rios, a venda ilegal de madeira. Ninguém vai fiscalizar. Sabe por quê? A política é que manda.

Até agora, por ironia do destino, o bloqueio da Renca acabou sendo um escudo de defesa da região contra o ataque das grandes mineradoras nacionais e internacionais. Esqueceram a Renca e os governos se sucederam.

Depois da criação da Renca, em 1984, sob o regime militar, foram criadas e consolidadas muitas Unidades de Conservação e algumas se superpõe à área. A Floresta Estadual Paru foi criada oficialmente em 2006; RDS Rio Iratapuru foi criada em 1997; APA Arquipélago do Marajó criada em 1989; Rebio Maicuru criada em 2006; PARNA Montanhas do Tumucumaque criada em 2002; FE do Amapá criada em 2006; Resex do Rio Cajari criada em 1990; Terra Indígena Waiãpi homologada em 1996; Terra Indígena Rio Paru D’Este homologada em 1997.


Com tantos exemplos em que os limites de Unidades de Conservação e terras indígenas não foram respeitados para que grandes projetos hidrelétricos fossem construídos na Amazônia, é irônico pensar que com a Renca extinta isso acontecerá. As unidades de conservação são, na verdade, um empecilho a ser removido para viabilizar mais que os 31% livres de superposição, para exploração mineral. É preciso recordar que Dilma reduziu unidades de conservação para fazer caber as usinas hidrelétricas planejadas no rio Tapajós. O que significa para o povo brasileiro “interesse da nação”?

Agora queremos respostas sobre o porquê açodado do desbloqueio da Renca a pedido do Ministério de Minas e Energia. O que realmente está por trás da Portaria de março de 2017? Política? Negócios com o Canadá? As empresas canadenses já estão presentes na Amazônia, desde a região de Belo Monte, no Xingu, com a Belo Sun Mining, até a exploração ao longo da bacia do rio Jamanxim. Então, por que um decreto tão sucinto? O mapa da época que o ilustrou mostra a região da Renca de forma a parecer um deserto.

Dou a pista aqui. Segundo a portaria do Ministério de Minas e Energia, o objetivo da extinção da reserva é o de "se criar mecanismos para viabilizar a atração de novos investimentos para o setor mineral". Eis o que significa para o governo o “interesse da nação”.  

A Vale na Renca
Em 1967 o Projeto Carajás da Vale se tornou realidade. É um exemplo devastador com feridas ainda abertas que jamais cicatrizarão. A exploração de Carajás criou uma espécie de tradição na vocação da região e despertou a cobiça dos militares e de empresas mineradoras do mundo inteiro. Quem pode garantir a integridade da Amazônia? Seria o Ministério do Meio Ambiente, capenga, sob a batuta de um ministro fraco e despreparado? Ou o Ibama, desestruturado, sem pernas nem para impedir o comércio ilegal da madeira retirada da floresta nas barbas da sociedade? Quem vai fiscalizar? Multar e punir? São apenas dois fiscais do Ibama na região da Renca.

Carajás
A Vale não podia explorar aquele quadrilátero de mais de 46 mil quilômetros quadrados antes de 1984, quando a Renca foi criada. Guardaram para o futuro. Congelar a região foi uma cortina de fumaça para impedir que as verdadeiras riquezas ali já descobertas e a descobrir pelos geólogos da CPRM e Vale fossem destinadas a outros interessados. Uma disputa da Vale com a British Petrolium (BP), pelos títulos e autorizações de lavra na Renca, ameaçava criar um quiproquó internacional contra o Brasil. O governo e a Vale preferiram bloquear “temporariamente” a reserva, evitando assim que a BP reivindicasse direitos.

O tempo passou, a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD) foi privatizada e se transformou na poderosa Vale, empresa que já ganhou o prêmio de pior do mundo.
   
Infelizmente, o futuro viria confirmar o título com o desastre de Mariana provocado pela negligência da Samarco. A Vale foi, também, campeã de contribuições a políticos. O PMDB do Temer foi amplamente beneficiado pelos milhões que ajudaram a eleger gente que manda no Ministério de Minas e Energia.

Em 2016 começou uma verdadeira campanha para “recuperar” a credibilidade da mineração brasileira e foi criado o Programa de Revitalização da Indústria Mineral Brasileira, composto por três Medidas Provisórias.

A CPRM
O projeto “Pesquisa Geológico-Econômica na Reserva Nacional de Cobre e seus Associados (Renca)”, sob o título de Projetos Especiais e de Apoio, foi citado apenas no Relatório Anual da CPRM do ano de 1990. Em mais nenhum relatório ele foi mencionado.

Esse foi o primeiro Relatório Anual da CPRM, de 1990, em que se escancarou o fracasso da companhia e a necessidade de se cobrir os prejuízos assumidos em dívidas com bancos, fornecedores, passivos trabalhistas, imóveis alugados. Como justificar os imóveis milionários da CPRM como um no Rio de Janeiro, com 26 mil m² de área construída.

Lista das unidades da CPRM no Brasil
A CPRM, ainda responsável pela Renca, é hoje uma empresa pública. Passou de Empresa de Economia Mista para Empresa Pública, em 1994. O objetivo da criação da Renca era o de garantir a exclusividade da CPRM na prospecção e lavra nessa rica região mineral. Mas as coisas não saíram como o planejado, pois em 1990 a CPRM tinha uma dívida de 10 milhões de dólares e muitas dificuldades para dar andamento nas suas atividades fins. Só ela teria autoridade para realizar pesquisas e concessões de lavra às empresas com as quais negociava. A Renca é parte disso.

A história da CPRM mostra o seu fracasso desde que a Renca foi criada. Sem recursos financeiros e técnicos, e sob forte influência política o programa fracassou. Em 1994 passou a ser Serviço Geológico do Brasil, ou seja, dormência absoluta, e alijado dos propósitos iniciais de levantamentos geológicos, geofísicos e pesquisa mineral que passaram à iniciativa privada.


O salvo-conduto da Amazônia teve início nesse momento. Sem recursos, relegada a um plano secundário, a CPRM não concluiu sua missão e foi o que preservou aquele rico quadrilátero até os dias de hoje. O conhecimento e pesquisa mineral da área congelou depois que a CPRM se tornou uma empesa pública, hoje conhecida como Serviço Geológico.

segunda-feira, 11 de setembro de 2017

Amazônia: a pilhagem continua


Processos minerários na Reserva de Cobre e seus Associados (RENCA)
(Retângulo rosa é a área da RENCA) Fonte: Sigmine. Edição Telma Monteiro
Por Telma Monteiro

"A riqueza subterrânea não explorada é a guardiã da outra riqueza, essa na superfície, a biodiversidade da Amazônia." (Telma Monteiro)
Levei um bom tempo para deglutir mais um crime contra a Amazônia. Desta vez pelo governo de plantão, sob a batuta de Temer, Rodrigo Maia e quiçá um tal de Fufuca. Quando você acha que não vai se surpreender com mais nada, acontece uma novidade que nunca é boa. A primeira analogia que me veio foi estupro. Liberar a Reserva Nacional de Cobre e Associados (RENCA), entre o Pará e o Amapá seria o mesmo que estuprar a Natureza na sua versão mais perfeita.

Entendo que o termo pode parecer muito forte, mas há que se chacoalhar a sociedade brasileira, essa alienada, em que vivemos atualmente. Aqueles que se manifestaram nas redes sociais, gritando contra a Portaria do Ministério de Minas e Energia e contra o famigerado Decreto de Temer, são, infelizmente, muito poucos. Aí Gisele, a bela, apareceu. Sua voz percorreu o mundo e o governo brasileiro, acuado, cedeu. Por 120 dias. Para discutir com a sociedade. Com quem? Você que está acompanhando essa possível mutilação, acredita?

Assisti gente inteligente, acadêmicos, jornalistas, especialistas, até ex- presidente do ICMBIO falando ou escrevendo que acabar com a RENCA seria uma espécie de redenção, um salvo conduto em defesa da biodiversidade da Amazônia. Mineradoras e garimpos clandestinos de ouro, pistas de pouso camufladas, estradas desenhadas na floresta impotente, poderiam ser controlados e desapareceriam com o desbloqueio da RENCA. Querem dizer que desbloquear a reserva é para impedir ilegalidades e dar espaço para as “legalidades” que costumam destruir o meio ambiente. 

Samarco, uma joint venture entre a Vale e a anglo-australiana BHP Billiton, destruiu o distrito de Bento Rodrigues, em Mariana, MG. Os responsáveis pela Samarco conseguiram, em alguma instância do nosso judiciário, se safar da garantia que teriam que pagar. Diante disso, pergunto se já não ficou bastante claro como as mineradoras, sejam elas brasileiras ou grandes conglomerados internacionais, não são confiáveis. Seus sites são verdadeiras pérolas de promessas de desenvolvimento, preservação, recuperação e sustentabilidade. A Samarco foi criada em 1977 e o rompimento da barragem de Bento Rodrigues não foi seu primeiro desastre. Há uma sequência deles que causaram enormes danos socioambientais onde a Samarco atuou e que ainda não foram compensados.

Como explicar que a Amazônia estaria “protegida” com a extinção da RENCA? Nem vou entrar na descrição de quantas mineradoras estariam invadindo legal e ilegalmente a área da reserva desbloqueada.

Ferrogrão – soja no coração da Amazônia

Estudo Preliminar 3 - Ferrogrão e a Soja na Amazônia                                                        Imagem: Brasil de Fato   ...